Era o dia 21 de novembro de 1964. O Papa São Paulo VI, em uma celebração na Basílica de Santa Maria Maior, em Roma, encerrava a terceira Sessão do Concílio Vaticano II (1962-1965); em cada um desses anos, os bispos do mundo inteiro se reuniam no Vaticano durante pouco mais de dois meses – outubro, novembro e começo de dezembro - para a aprovação de Documentos da Igreja. Ao longo da terceira sessão havia sido aprovado o texto mais importante do Concílio: A constituição dogmática “Lumen Gentium” (Luz dos Povos), sobre a Igreja, cujo capítulo oitavo é dedicado à Nossa Senhora, com o título: “A Bem-Aventurada Virgem Maria, Mãe de Deus, no mistério de Cristo e da Igreja”.
Em suas palavras, na Basílica, o Papa surpreendeu os presentes ao declarar: Para glória da Virgem e para nosso conforto, proclamamos Maria Santíssima MÃE DA IGREJA, isto é, de todo o Povo de Deus, tanto dos fiéis como dos pastores que lhe chamam Mãe Amorosíssima, e queremos que com esse título suavíssimo seja a virgem doravante honrada e invocada por todo o povo cristão. Após estas palavras, ressoou pela basílica um aplauso prolongado e emocionante, demonstrando o quanto o novo título correspondia ao desejo dos presentes. Nossa Senhora, a Mãe de Jesus, a Mãe do Filho de Deus, a Virgem de Nazaré, a “serva do Senhor”, ganhou então um novo título oficial. Mas o que ele significa?
Maria, aceitou dar carne humana ao Verbo Divino tornando-se colaboradora na obra da salvação. Jesus Cristo, seu Filho, assumindo a nossa natureza, libertou-nos do pecado. Além disso, ela brilha como modelo de virtude diante de toda a comunidade dos eleitos e socorre o povo que Cristo salvou. Maria não realizou isso por méritos próprios, mas porque Deus a escolheu e a preparou para essa missão.
Isabel dirá que Maria é feliz porque acreditou. É justamente essa fé que a levará a ser, junto aos discípulos de Jesus, uma presença materna. No Calvário, ela estava de pé” e recebeu João como filho, que por sua vez a recebeu como Mãe e a levou para sua casa. Em João, cada um de nós estava no calvário, junto à cruz de Jesus e ao lado de sua Mãe.
Por que Maria é Mãe da Igreja? Em primeiro lugar, porque sua vida esteve sempre centrada no Senhor. Ela expressou isso, na Anunciação, ao se apresentar: “Eis aqui a serva do Senhor” (Lc 1-38). Depois sua vida foi marcada pela disponibilidade: “Faça-se em mim, segundo a tua palavra”. Ela estava sempre pronta a perceber e responder aos sinais de Deus. Ao ouvir: “Também Isabel, tua parenta, até ela concebeu um filho na velhice, e já está no sexto mês, aquela que é tida como estéril” (Lc 1.36-39) decidiu ir apressadamente às montanhas para prestar ajuda à Isabel.
Maria tinha capacidade de repartir os dons que recebia. Ela recebeu Jesus e o deu aos pastores por ocasião do natal; aos magos, quando o visitaram o “rei dos judeus”; a Simeão e a Ana, no Templo em Jerusalém e ao Pai, no Calvário. Ela era fiel à Palavra de Deus: levou Jesus ao Templo (Lc 2. 22-24), em cumprimento das exigências da Lei. No livro do Êxodo (3.1-3) havia uma determinação: “o primogênito deveria ser consagrado ao Senhor, como memória do dia em que Ele libertou seus filhos do Egito.
No livro do Levítico (12. 1-8) lê-se a prescrição: “quando a mãe der à luz, deverá ir ao Templo para purificar-se, oferecendo ao Senhor um cordeiro e um pombinho, ou dois pombinhos.
Marinha tinha senso de responsabilidade: ao reencontrar Jesus, depois de três dias que o procurava, ela lhe perguntou: "Por que nos fizestes isto? Eis que seu pai e eu procurávamos, ansiosos"! (Lc 3.48). Ao mesmo tempo, respeitava, com seu silêncio, os mistérios de Deus. Nessa ocasião, segundo o evangelista, tendo ouvido a resposta de Jesus: "Por que me procuráveis? Não sabíeis que devo me ocupar das coisas de meu Pai?" Ela "guardou tudo em seu coração", o que havia feito por ocasião da visita dos pastores (Lc 2.19) Ela participou da vida de Jesus: "Tua mãe e teus irmãos estão lá fora e te procuram" (Mc 3.33) inclusive no calvário, onde "estava de pé". (Jo 19.25)
Enfim, a Mãe de Jesus era aberta ao novo: quando a comunidade se reuniu no Cenáculo, esperando a manifestação do Espírito Santo, ela estava lá: "Todos estavam reunidos... com Maria, a Mãe de Jesus" (Atos 1,14). Por tudo isso, foi bem merecido o título que recebeu de "Mãe da Igreja", pois ela foi uma perfeita discípula de Cristo. Este título, a bem da verdade, já fazia parte da devoção de seus filhos e filhas, que assim a chamavam muito antes da proclamação papal.
Dom Murilo S. Krieger - Arcebispo Emérito de São Salvador - Bahia
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