Amo o Rio. Aliás, isso não é novidade para quem convive comigo, para vocês, estimados leitores. Sou mineiro e orgulho de minha mineiridade. Ultimamente, tenho circulado com mais frequência pela nossa capital e me encanto cada vez mais com esse Belo Horizonte que descortino em cada amanhecer. Mas vou falar do Rio de Janeiro, essa cidade que me fascina desde a juventude, quando pela primeira vez, fui ao Maracanã e vi o meu Flamengo vencer o Botafogo por 2 a 1, fui à Quinta da Boa Vista, ao Corcovado onde o Cristo Redentor me abre os braços, no Morro do Pão de Açúcar, Aterro Parque e Praia do Flamengo, Leme, Copacabana, Ipanema, São Conrado, Praia e Morro da Urca, Lagoa Rodrigo de Freitas, a Catedral Metropolitana, a Igreja da Candelária e tantas outras de vários estilos, o CCBB, o Instituto Moreira Sales, o Jardim Botânico, o Sítio e antiga residência do paisagista Burle Max, Parque Laje, a Casa de Rui Barbosa, o saudoso Canecão por onde passava a história da MPB e, onde assisti shows memoráveis, Museus, Teatros, a Cinelândia, Biblioteca Nacional, o Teatro Municipal, o charme do Bar Amarelinho, o antigo cine Odeon, a Gávea e o Museu do Flamengo, Ilha da Gigóia, o Forte de Copacabana, praças, parques, orlas, morros, vales, mares, montanhas, essa geografia exuberante nesse pequeno paraíso de um imenso Brasil tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza.
No entanto, depois de todo esse prólogo, o assunto de que vou falar, é o oposto. Li, hoje, no segundo caderno de O Globo, artigo do jornalista Gustavo Pinheiro, que como eu ama também essa cidade e, talvez em razão disso mesmo, escreveu esse artigo que vou transcrever aqui:
Fernando Mauro Ribeiro
CENTRO, À NOITE É PARA OS FORTES
“Fui ao teatro no Centro, domingo à noite. Das seis saídas do metrô Cinelândia, quatro estão permanentemente fechadas aos finais de semana. A alternativa foi a Rua do Passeio, um lado mais agitado, com ambulantes e o vai e vem do Teatro Riachuelo. Mas quando se vira para o outro lado da praça... o cenário é de série apocalíptica. Apenas zumbis cruzam a Cinelândia, pra lá e pra cá, esperando os incautos. Odeon fechado, Municipal fechado, Amarelinho fechado, escura, deserta, a praça é um convite para metade dos crimes listados no Código Penal.
A Avenida Rio Branco que na época de Getúlio Vargas era mão dupla e depois foi mão única, há algum tempo é mão nenhuma no trecho da Cinelândia. O resultado é uma rua erma, desde que foi proibida o trânsito de carros para passagem do trem do VLT, sempre vazio. Costumava ir ao CCBB de metrô, saltava na Uruguaiana, descia na Rua da Alfândega até a 1º de Março. Fiz isso por anos. Atualmente, é preciso ter muito pouco amor à vida para se arriscar nesse trajeto. A pandemia jogou a última pá de cal no que já não ia bem das pernas. Durante o dia o que mais se vê são lojas fechadas. À noite, moradores de rua.
No domingo, escondi o celular, respirei fundo, apertei o passo e cruzei a Cinelândia. Ao final da peça, uma roda de senhoras não conseguia disfarçar um certo pânico para sair dali, formamos um grupo e fomos de manada até à boca do metrô, único lugar onde havia polícia, talvez por ser o ponto mais seguro. Sábios policiais.
Produzir teatro é para os fortes. Luta-se contra tudo basicamente: a falta de estrutura, de patrocínio, de espaço para divulgação, ainda ter que tourear com as deficiências da segurança pública é uma missão pesada demais. Para quem produz, mas também para quem senta na plateia.
Verdade seja dita, nos últimos anos, prefeitura e Governo do Estado recuperaram equipamentos culturais importantes na cidade, como o Carlos Gomes, o Teatro Ipanema, o Ziembinski, o Domingos Oliveira, o Gláucio Gil, O João Caetano e o Municipal. É louvável, mas é importante garantir a integridade física de quem os frequenta.
Os planos da prefeitura de revitalização do Centro, especialmente estimulando a moradia, só se tornarão viáveis, se houver uma percepção mínima de vida de bairro, com teatros, cinemas, lojas e restaurantes. Não é o que acontece hoje.
Esperar que isso seja trazido por lançamentos imobiliários, é inverter a lógica. Ou as autoridades morariam na Almirante Barroso ou na Rua da Quitanda do jeito que estão?
O Centro é um dos principais polos de cultura do Rio e, ainda mais significativo para o teatro. É ali que estão o Sesi Centro, as salas do CCBB, o Teatro dos Correios, a linda sala da Justiça Federal, o Glauce Rocha, o teatro da Caixa Cultural, o Nelson Rodrigues, o Carlos Gomes, o João Caetano, sem falar no Municipal. Um corredor teatral de fazer inveja a qualquer cidade. Os produtores culturais fazem a sua parte, oferecendo uma programação atraente. A plateia faz a sua parte e prestigiam. Falta o poder público fazer a sua parte e oferecer o mínimo: segurança”.
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