Morreu hoje, Adílio de Oliveira Gonçalves. Quando de minha última visita à sede do Flamengo, na Gávea, em 2022, visitei o Museu do Futebol. Fiz fotos na sala com as centenas de troféus, vi Adílio e Nunes, os bustos de alguns jogadores que fazem parte da história do clube, comprei um livro, fiz um lanche na lanchonete, recordei da primeira vez que eu estivera ali, com meus 19 anos de idade. O tempo passou e a paixão só fez aumentar, me lembrei das dezenas de vezes que fui ao Maracanã e vibrei com as vitórias do Mengão e finalmente me pus a contemplar demoradamente, a bandeira do Flamengo a tremular no céu azul do Rio de Janeiro e o rosto sereno daquele rapaz, - ou para dar um tom mais solene, eu diria senhor Adílio de Oliveira Gonçalves - retratado em busto de bronze no hall de entrada, em uma justa homenagem.
Consternado, com a notícia do falecimento de um de nossos campeões mundiais, dei uma espiadinha nas minhas redes sociais, onde encontrei vários posts de torcedores, falando da trajetória e da importância desse atleta para o Flamengo. De fato, a nação está de luto, o camisa oito marcou época e escreveu uma linda página da história do Flamengo. Protagonizou momentos inesquecíveis, como por exemplo o segundo gol na final do Mundial de Clubes, contra o Liverpool.
“Se o Flamengo fosse uma pessoa, o Flamengo seria o Adílio ou o Adílio seria o Flamengo. Pela simplicidade, pela garra, pela técnica. Eu acho que um ídolo não é feito somente dentro de campo. Os feitos contam muito, mas principalmente como ele trata as pessoas, o ser humano de um modo geral”, disse um rubro-negro ontem nas redes sociais. Concordo plenamente, e em se tratando do “Neguinho da Cruzada”, como era carinhosamente chamado pelo locutor esportivo Jorge Curi, Adílio, era um craque dentro e fora de campo. Um cidadão que respirava Flamengo, que viveu com simplicidade e a todos atendia com o mesmo carinho.
Em uma partida de futebol: O Jogo das Estrelas, ele viera em companhia de Donizeti e Túlio, na Vila Vardiero, no campo do Montanha e, esbanjando simpatia, fez fotos com a galera, abraçou os fãs e bateu aquela bola redondinha que, como poucos, sabia jogar. Onde ia o Adílio, seguia-o uma legião de fãs. Não era diferente, mesmo depois de ter encerrado a carreira de jogador, em razão do futebol refinado, dos jogos memoráveis, dos gols antológicos que marcara, dos títulos inesquecíveis que conquistara, mas também em virtude de seu carisma, sua simplicidade, do afeto com que atendia a todos.
UM BATE PAPO COM O ÍDOLO
Novo Tempo: Adílio, fale um pouco de sua infância.
Adílio: Quando eu era criança, eu tive dois baques na minha vida: aminha mãe, que me segurava, depois meu irmão mais velho, minha referência: ele dizia: Você será um grande jogador, eu ainda vou ver você brilhar... aí, eu perco os dois, minha mãe e meu irmão. Cara, o mundo veio abaixo. Uma grande dor, dificuldades de todo tipo, né. Morador de Favela – ele era da Cruzada São Sebastião, uma Comunidade próxima a São Conrado – sem uma estrutura familiar e ter que tocar a vida. Era preciso seguir em frente!
Novo Tempo: Há uma história de que você e Júlio César, saltamos o muro da Gávea e pediram para treinar. Como conseguiu ingressar no Clube de Regatas do Flamengo?
Adílio: Sim, há essa história. Mas, como eu estava dizendo das dificuldades, eu sigo, dizendo que: Então, entrou o Flamengo na minha vida. Foi uma pessoa, que em nome do Flamengo, foi me buscar e disse: nós vamos te ajudar. Tudo o que você precisar. Nós faremos por você. Você vai morar por aqui, dentro de uma situação, conte conosco.
Novo Tempo: Sua trajetória, nós conhecemos, mas como foi chegar no Flamengo?
Adílio: Feliz com a oportunidade, mas um pouco assustado com tudo aquilo. Aí, sabe o que eu falei para ele, parceiro? Eu vou retribuir a tudo o que o Flamengo faz por mim, a tudo o que o Flamengo me deu. Vou devolver em dedicação, defendendo essa camisa e quando eu chegar no profissional vou conquistar muitos títulos. E foram todos esses anos dedicados ao clube.
Novo Tempo: Você pagou com juros e correção monetária, meu caro. E a torcida do Flamengo tem um enorme carinho por ti e uma gratidão eterna. O que é a torcida do Flamengo para você?
Adílio: É tudo, tudo né, Cara! Porque eu fui torcedor também, né. A felicidade da torcida é também a minha felicidade, as suas alegrias são minhas também. Minha mulher, quando sai comigo, sabe que tem que ter paciência, tem que esperar, porque cumprimento todo mundo, dou atenção a todos.
Novo Tempo: Fale de uma lembrança.
Adílio: Me lembro daquela derrota de 6 a 0 para o Botafogo. Eu estava no Maracanã, como jogador do “dente de leite” – é como era chamado o jogador da base, naquela época – Então, eu disse para mim mesmo: “um dia serei titular do Flamengo e vamos reverter isso aí. Um dia devolveremos os 6 a 0. E esse dia chegou!
UM ANJO RUBRO-NEGRO QUE VOA RUMO À ETERNIDADE
“As asas de um moleque sonhador o fizeram superar qualquer muro. Os campos da Gávea construíram amizades angelicais. Seus pés pareciam flutuar com a bola nos pés e foi assim que Adílio conquistou o mundo vestindo o Manto Sagrado. Seu sorriso, sua generosidade e sua bondade, encantaram a quem o conheceu.
O símbolo máximo do rubro-negrismo expresso no abraço infinito: comemorar gols de títulos com os braços rumo aos céus, dando jeito para cabermos milhões de nós na catarse da euforia, amor e paixão. Seus dribles, seus gols e comemorações marcaram para sempre a história do Mais Querido.
Todo brasileiro tem o privilégio de reverenciar o “Brown” como integrante da prateleira mais alta do nosso panteão. Hoje, nos despedimos do nosso camisa 8, mas para nossa sorte, assim como o traçado do número eternizado, Adílio é infinito”.
ADEUS A ADÍLIO: ÍDOLO DA NAÇÃO RUBRO-NEGRA
“O Adílio para mim, sempre foi a minha referência, né, caindo ali pela esquerda... eu, moleque de arquibancada, encantando e, ele me deu muitas alegrias como torcedor e depois como jogador. Porque eu estreei no Flamengo, entrando no lugar dele em 9 de março de 1996 e na hora do abraço, ele poderia estar triste por sair contundido de uma partida, mas não; ele deu forças para um moleque de 18 anos. Ele era assim. O craque da humildade, da simplicidade. Nunca ouvi ninguém dizer nada diferente desse cara. Era mesmo um amigo, um irmão. Até mesmo quem não era rubro-negro o admirava por tudo isso. Não chamava atenção, mas brilhava, onde estava ele brilhava. Eu passei de torcedor, a amigo, parceiro de clube, tive o privilégio de conviver com um cara que só fez o bem. Agora, momento de despedida, momento de tristeza, mas ele ficará na minha lembrança e no meu coração para sempre”. (Jorginho)
“É uma perda muito grande. Quando cheguei no Flamengo em 1974, aprendi muito com ele. Eu o tenho como um irmão. Jogamos juntos mais de 15 anos no Flamengo, as pessoas, na rua me chamavam de Adílio e às vezes, o chamavam pelo meu nome. As pessoas se confundiam e nós nos divertíamos com isso. Não sei como será a partir de agora. É muito doído, muito triste, a gente nunca tá preparado para esse momento. Um cara com 68 anos ainda tinha muito a nos ensinar”. (Andrade)
“A gente era muito próximo. Nas viagens, nas concentrações, dormíamos no mesmo quarto. Para mim, é um dos maiores ídolos da nação rubro-negra. Pai de família exemplar, grande companheiro, pessoa maravilhosa, aprendi muito com ele. Principalmente pela humildade pelo respeito ao próximo. Vou sentir muita saudade. (Nunes)
Foram muitos anos de convivência. Primeiro, no futebol de salão, quando eu ia para ver ele jogar, depois foi incorporado ao grupo, e mesmo depois que ele parou de jogar, a gente continuou amigo. Convidei-o para ser professor lá na Escolinha do CFZ, Ele era sócio proprietário dos Jogos das Estrelas. Então, era uma amizade que se perpetuou. Ele não era um irmão de sangue, mas um irmão que passou a fazer parte da minha família. Eu o visitei no domingo, nós sabíamos que a situação dele era grave, nós conversamos, falei da possibilidade de ajudar, mas o Adílio era do tipo que não gostava de ocupar a ninguém. Infelizmente, o câncer voltou e muito agressivo e nada se pôde fazer. É claro que é triste, que dói. Ele era muito dedicado. Não só dentro do futebol, mas em tudo que fazia. Nosso grupo era muito unido. Estamos muito tristes.
(Zico)
Depoimentos colhidos das redes sociais e enviados por um amigo
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