É... Brasileiro não tem memória mesmo. E todo mundo ou melhor (todo brasileiro) diz isso, sem criar vergonha na cara. Seria cômico se não fosse trágico: a imensa maioria não se lembra mesmo sequer do título da penúltima telenovela.
Tá certo que isso não faz diferença nenhuma, mas quando se constata que um folhetim televisivo dura apenas 180 dias aproximadamente, adquire-se certa decepção quanto ao interesse do brasileiro por si próprio. E o que dizer então, de fatos relevantes que aconteceram há dez anos ou mais?
A intenção era iniciar esse artigo fazendo um belo retrospecto da cena cultural do país na última década. O espaço é pequeno, pois não pretendo me alongar. Mas retrocedendo um pouco, me parece que os anos 80 e 90 acabaram sendo pelo menos por aqui, se não os mais inspirados, os mais razoáveis do século XX.
Depois do boom da “Nova República” e do “fim” da censura, parecia ter ficado claro que a arte não sofreria mais qualquer tipo de restrição. Músicas, livros, teatro, filmes e até mesmo telenovelas politizadas eram redundantemente comuns.
No entanto, já naquela época, havia se iniciado lá fora o processo de fusões das mega-corporações elas acabaram de resultar, quase que imediatamente, numa espécie de arrastão global. Desde então, vêm dominando todos os setores de atividades possíveis planeta afora.
Também não é novidade que cultura e informação, no Brasil, nunca foram prioridades, muitíssimo pelo contrário. O que a santíssima trindade mandatária, (congresso, empresários e concessionários dos meios de comunicação) quer, é que o povo morra burro e pobre.
Por isso, nada mais justo que começarmos pela axé-music. Porque, talvez tenha sido, como disseram alguns críticos: o maior atraso sofrido pela música popular brasileira em todos os tempos.
Bom, o assunto é vasto. Eu poderia falar aqui dessa invasão de sertanejos – os sertanejos que se intitularam “universitários” - com músicas e letras pobres, repetitivas.
Ritmos como o “arrocha”, “Calipson”... E o funk? Os chamados “proibidões”, que fazem apologia ao crime, ao tráfico, que utilizam palavrões e que colocam as mulheres como objetos sexuais?
Melhor que eu pare por aqui. Sei que vão contestar. Fato que não me incomoda. Pelo contrário, provocar debates é positivo. Perturba-me, na verdade, ver crianças protagonizando essas dancinhas, vestirem-se como adultas, funqueiras ao invés de brincarem, ler, estudar.
O ano era 1984. Vamos ver o que disseram alguns artistas consagrados:
MARIA BETHÂNIA, EXPONDO A ALMA
“O artista verdadeiro não tem como se esconder. Há gente que canta porque é uma profissão que dá pé. Este não é absolutamente o meu caso. No palco, despejo minha alma, grito com força e faço a minha loucura”.
Maria Bethânia, há vinte anos, vem se constituindo numa legenda da Música Popular Brasileira, desde que subiu ao palco para substituir Nara Leão, no show Opinião e imprimiu uma interpretação enérgica e inesquecível a “Carcará”.
Em seu último LI, Ciclo (Polygram) Fogueira é uma das canções de amor revisitadas por Bethânia que demonstrava sua capacidade de recriar o número de outros intérpretes – no caso, a cantora/compositora Ângela Rô Rô.
Bethânia considera Ciclos um dos principais trabalhos em sua longa carreira. Este disco é um ato de coragem da minha parte porque do jeito que a música é massacrada no Brasil, atualmente, é um ato de coragem eu me expor dessa maneira, ser tão verdadeira na escolha de um repertório tão sincero.
GUILHERME ARANTES: ROCK DE CIDADE GRANDE
“A música de São Paulo ainda é eclética, sem tradição, como toda arte daqui. Então, a partir do ambiente das tensões, das neuroses da cidade grande, a luz do mercúrio, a barra industrial”.
Assim Guilherme Arantes definiu certa vez, seu trabalho que segundo ele “deriva de música de rádio, essa coisa muito bem industrializada, muita mais para Joelho de Porco do que para Renato Teixeira.
Paulista de nascimento e de coração, Guilherme Arantes começou a tocar órgão em “bandas de garagem”, lá por volta de 1966. Em 1974 conseguiu finalmente gravar um LP como integrante do conjunto Moto Perpétuo.
Dois anos mais tarde, lançou-se à carreira solo, assinando contrato com a Som Livre que lhe assegura a inclusão da música em telenovelas da Globo.
Dá-se então o sucesso de “Meu mundo e nada mais” e “Baile de Máscaras. Veio então o estouro de “Aprendendo a jogar”, na voz de Elis Regina, e a consagração no MPB-81 com a música Planeta Água.
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